Abuso

Abuso

Performance e texto de Carla Santos

A performance realizada no mês de novembro de 2022 foi feita em um viés de protesto à “normalização” de abusos sexuais praticados contra mulheres dentro de seus relacionamentos amorosos, trazendo como principal elemento provocador da criação desta performance um relacionamento em que eu fui a vítima. Foi realizada em uma das salas de prática da ETDUFPA, estava utilizando apenas um pequeno short preto e fitas adesivas que tapavam os seios e a boca. A fim de trazer um tom mais melancólico dentro da sala do experimento, uma aluna tocava teclado, cujo som ficava ao fundo, não havia nenhum texto falado, apenas pessoas entravam em pequenos grupos – para facilitar a interação e não haver superlotação na sala, melhorando o aproveitamento –  e interagiam marcando o corpo que estava disposto no centro da sala com tintas e um batom, que estavam dispostos em um banco, podendo fazer desenhos, escrever ou interagir como preferissem com o corpo utilizando os elementos. Após a interação, as pessoas se deparavam com cinco envelopes ao lado do corpo imóvel, nos quais haviam relatos escritos e coletados de mulheres que sofreram violências sexuais dentro de seus relacionamentos amorosos, e por muitas vezes não conseguiram identificar imediatamente. A duração foi ao todo de mais de 1 hora.

Essa performance teve influência direta dos métodos utilizados pela artista/performer Marina Abramovic, principalmente da sua obra “Ritmo 0” e utilizando alguns elementos e conceitos como inspiração. O foco da minha performance era ao mesmo tempo em que sensibilizava os que estavam presentes acerca da denúncia sobre a violência sexual que mulheres sofrem dentro de relacionamentos, também provocar uma crítica sobre o quão fácil é sentir a permissão para tocar no corpo do outro, da mesma forma que em relacionamentos alguns parceiros se sentem permitidos a violar seus cônjuges, os participantes que contracenaram com a performance rapidamente se sentiram confortáveis em interagir com toques ou pintando com as tintas e batons aquele corpo que estava disposto na sala. Havia uma placa indicando o que deveriam fazer: interagir, entretanto não era algo imposto, apenas um participante entre todos se recusou a interagir com o corpo imóvel.

Durante a performance, procurei ficar mais imóvel e apática possível, porém em alguns momentos sentimentos vieram à tona e lagrimas surgiram para marejar meus olhos, contudo não fiz nada que não me senti confortável a fazer, apenas me sensibilizei com a questão que eu mesma abordei e com os sentimentos que afloravam as pessoas, principalmente mulheres, ao abrir e ler as cartas que estavam ao lado do meu corpo. Concluindo, quase todas as pessoas interagiram, como foi incentivado, com o corpo a disposição no centro da sala, com exceção de um rapaz que apresentou desconforto e ficou apenas observando. Apesar de ter conseguido impactos satisfatórios, acredito que a crítica sobre o quão fácil é se sentir livre para tocar no corpo alheio não foi compreendida, e acredito que os participantes apenas tenham entendido que a performance se tratava de unicamente uma crítica aos abusos vivenciados pelas mulheres na sociedade em que vivemos.

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