A Viagem de Ana Maria

A Viagem de Ana Maria

Performance de Ana Maria Rodrigues Quaresma
Texto e fotografia de Danielle Cascaes

A Viagem de Ana Maria é uma performance que questiona as fronteiras entre o cotidiano e a arte, mostrando a experiência de uma mulher quilombola que transita entre diferentes espaços e tempos, como a cidade e sua comunidade, a casa e a universidade. A performance não apenas representa a história de Ana Maria, mas também ressignifica os limites entre arte, vida e resistência. Ao seguir a proposta de Patrice Pavis (2011), que defende a permeabilidade das fronteiras no campo performático, podemos ver que a encenação não apenas ultrapassa os limites tradicionais do teatro, mas redefine o papel da performance como um dispositivo político e ativista. A fronteira entre a realidade e a arte se dilui, permitindo que a artista questione a própria natureza do teatro enquanto um espaço de reflexão e transformação social. A performance de Ana Maria, com sua jornada exaustiva entre o quilombo e a cidade, incorpora uma prática de resistência cultural e social, afirmando a possibilidade de reinvenção e deslocamento das fronteiras impostas pela sociedade.

Além disso, como Pavis (2011) sugere, a arte contemporânea não pode ser pensada sem considerar as interconexões entre diferentes esferas da experiência humana, como a política, a identidade e a memória. Ana Maria, ao contar sua história, não apenas narra sua própria luta, mas também questiona as fronteiras culturais e sociais que definem o lugar de mulheres como ela, cujas trajetórias são muitas vezes invisibilizadas. Sua jornada não é só pessoal, mas se conecta a um movimento mais amplo de reconfiguração das identidades e das práticas artísticas. Ela ultrapassa as fronteiras entre o teatro e a vida, entre a narrativa individual e a coletiva, refletindo a complexidade das múltiplas identidades que a performance pode encarnar.

Em relação ao processo de Ana Maria, podemos também associá-lo à teoria de Richard Schechner sobre o “tempo simbólico”. Na performance, o tempo cronológico da jornada de Ana Maria se entrelaça com o tempo da memória e da transformação. O trabalho com a temporalidade cria uma interseção entre os diferentes momentos da vida de Ana Maria, questionando o conceito linear de tempo e destacando o poder da performance de ressignificar os tempos pessoais e sociais. Ao integrar sua rotina, sua luta e suas escolhas na obra, Ana Maria estabelece uma conexão entre o passado, o presente e o futuro, configurando um novo tempo simbólico onde as fronteiras do tempo social se diluem.

Por fim, a jornada de Ana Maria, como proposta no relatório de sua própria trajetória acadêmica e pessoal, convida à reflexão sobre o papel da educação e da luta cotidiana de mulheres em contextos de desigualdade. A performance, nesse sentido, é um convite para pensar não apenas a trajetória individual de Ana Maria, mas também as fronteiras que limitam o acesso à educação, à dignidade e ao reconhecimento social. Em um Brasil marcado pela desigualdade, sua história, sua luta e sua performance se tornam uma potente denúncia das barreiras que persistem e da capacidade de superação de mulheres como ela.

REFERÊNCIAS

PAVIS, Patrice. Dicionário da performance e do teatro contemporâneo. 2011.

SCHECHNER, Richard. Performance Studies: An Introduction. Routledge, 2006.

SCHECHNER, Richard. The Future of Ritual: Writings on Culture and Performance. Routledge, 2002.

SCHECHNER, Richard. Performance Studies: An Introduction. Routledge, 2013.

PEREIRA, Antonia. Performance e ritual: questões sobre o corpo e a representação. 1995.

QUARESMA, Ana Maria R. Relatório de Ana Maria sobre a performance “A Viagem de Ana Maria”, entregue à professora Karine Jansen. 2024.

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